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Bexiga Hiperativa


Ontem, 15 de agosto de 2013, tive a satisfação de palestrar no VI Congresso Goiano de Neurologia sobre a contribuição da fisioterapia no tratamento da Bexiga Hiperativa. E agora, gostaria de compartilhar aqui no blog um pouquinho sobre essa síndrome.

Bexiga Hiperativa trata-se de uma síndrome consistindo de urgência, com ou sem urge-incontinência, e frequentemente associada ao aumento da frequência miccional e noctúria (frequência miccional que interrompe o sono noturno); na ausência de outra etiologia. A urgência, portanto, é o sintoma chave dessa síndrome. Nesse caso, a urgência é uma sensação vesical repentina e associada com um desejo imperioso de urinar, não deve ser confundida com a vontade de urinar fisiológica que vai progressivamente ficando mais intensa a medida que a bexiga vai enchendo.

Bexiga hiperativa não deve ser confundida com hiperatividade detrusora (detrusor é o nome dado ao músculo da bexiga). Esta última consiste de contrações involuntárias do detrusor verificadas através de estudo urodinâmico (um tipo de exame). 

Bexiga hiperativa também não é sinônimo de bexiga neurogênica, pois para ser neurogênica é necessário ter uma patologia neurológica causando a disfunção vesical, o que é possível, mas não é uma regra, uma vez que existe bexiga hiperativa idiopática (que não tem causa definida).

A Bexiga Hiperativa afeta cerca de 10% da população adulta geral, sendo que a prevalência aumenta com a idade. O percentual de mulheres afetadas é maior até o início da sétima década de vida, quando os homens passam a ser mais afetados.

Essa síndrome causa significativo impacto na qualidade de vida, comprometendo vários domínios:

  • Ocupacional: abstenção do trabalho e diminuição da produtividade;
  • Sexual: evitação de contato sexual e íntimo;
  • Físico: limitação ou cessação de atividades físicas;
  • Social: redução do interesse em interações sociais, limitações pela necessidade de acesso rápido ao banheiro;
  • Doméstico: necessidade de absorvente/fralda, capas para colchão, preocupações com roupas;
  • Psicológico: sentimentos de culpa, depressão, ansiedade; diminuição da autoestima; medo de ser um incomodo e de perder urina;
  • Mental: diminuição da performance cognitiva pelo distúrbio do sono (paciente acorda várias vezes para ir ao banheiro = noctúria).

O tratamento da Bexiga Hiperativa é guiado pela necessidade de promover um esvaziamento completo da bexiga, preservar o bom funcionamento renal, evitar complicações e, principalmente possibilitar a inclusão social e profissional do paciente ao adquirir a reeducação urinária.

Os pacientes com Bexiga Hiperativa, seja idiopática ou de origem neurológica, são habitualmente tratados com drogas anticolinérgicas. Contudo, sabe-se que esses medicamentos provocam inúmeros efeitos colaterais, o que gera alta taxa de abandono do tratamento. Em função disso é importante que o paciente tenha conhecimento sobre as demais opções terapêuticas que estão ao seu alcance.

A fisioterapia deveria ser considerada como primeira opção terapêutica para os pacientes que sofrem com a síndrome da Bexiga Hiperativa, por ser o tratamento menos oneroso, menos invasivo, com bons resultados, e não havendo o resultado esperando, essa terapêutica não prejudica a seleção de um outro tratamento.

A fisioterapia contribui por meio de três aspectos principais:

  • Terapia comportamental: engloba o treinamento vesical (estabelecer rotina urinária), reeducação dietética (orientação sobre ingestão de líquidos, diminuição/cessação do consumo de substâncias irritativas como cafeína, bebidas gaseificadas e álcool).
  • Reabilitação do assoalho pélvico: principalmente através do treinamento dos músculos do assoalho pélvico, podendo ser utilizando como auxiliares biofeedback, eletroestimulação, cones vaginais. Isto, porque contração ou contrações repetidas dos músculos do assoalho pélvicos são uma estratégia para prevenir a urge-incontinência, por meio de um reflexo chamado períneo-detrusor ou reflexo de inibição recíproca.
  • Eletroestimulação transcutânea do nervo tibial posterior: técnica em que se posiciona eletrodos na região interna de tornozelo, região por onde passa o nervo tibial posterior, com intuito de se causar um estímulo sensorial e motor, que será projetado na medula espinhal, na mesma área onde as projeções da bexiga são encontradas, inibindo as contrações involuntárias da bexiga.
Além do tratamento fisioterapêutico e farmacológico o paciente ainda tem como opções terapêuticas a neuromodulação, aplicação de toxina botulínica (controversa nas Bexigas Hiperativas idiopáticas) e tratamento cirúrgico. 

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